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quarta-feira, 28 de novembro de 2012

As causas da violência em SP.

(do Transparência SP)
 
Este blog não tem falado nos últimos dias sobre a onda de violência no Estado de SP. Na verdade, já estamos denunciando os problemas na área a muitos anos. Agora, neste momento de crise, deixamos a grande imprensa se manifestar, já que isso é muito raro.
De qualquer modo, algumas questões fundamentais devem ser sempre lembradas, até porque não são apontadas pela mídia.
Primeiro, o modelo de segurança pública no Brasil e no Estado está falido, com a existência de diversas polícias (militar, civil, científica, agentes penitenciários) que não atuam de forma articulada. No dia a dia, se odeiam. Incluir a esfera federal e sua polícia não necessariamente melhorará o quadro.
Em segundo lugar, o governo paulista, diante da falência do modelo geral, fez uma aposta ainda mais problemática: a militarização da investigação.
Como se percebe, a situação piorou.
 
Se não bastasse esta situação, o governo paulista não consegue sequer gastar os recursos destinados aos investimentos (obras e material permanente) na segurança.
Apesar da indignação do governador com a reportagem da Folha de SP, o números são "frios":
Os investimentos na segurança de janeiro a novembro de 2012 foram de apenas 8,3% (se considerarmos os valores liquidados - despesas já comprovadas) e 44,7% (se considerarmos os valores empenhados - despesas reservadas).
 
Apesar da crise, Alckmin investiu 45% da verba de segurança pública
 

Polícia Civil foi a área com menos investimento, com uso de 15% do dinheiro previsto no Orçamento
Recursos são para a compra de veículos e de equipamentos de inteligência; governo diz que índice vai subir
 
(da Folha de SP, por Rogério Pagnan e Afonso Benites)
 
Faltando pouco mais de 30 dias para fechar um dos anos mais violentos em São Paulo desde o final da década de 1990, o governo Geraldo Alckmin (PSDB) aplicou apenas 44,6% do previsto no Orçamento para investimentos na área de segurança pública.
Dados do sistema de acompanhamento da execução orçamentária (Siafem) mostram que a Secretaria da Segurança Pública empenhou (comprometeu) até a semana passada R$ 195,2 milhões dos R$ 437,9 milhões do Orçamento.
Se for considerar o valor liquidado (que efetivamente deixou os cofres), foram despendidos apenas R$ 36 milhões, ou 8,2% do planejado.
Essa verba não inclui despesas com custeio da pasta (como folha de pagamento), mas apenas investimentos como compra de veículos, construção de prédios ou aquisição de equipamentos de informação e inteligência.
A Polícia Civil foi a que menos gastou, empenhando apenas 15% do que havia orçado. Nesse período, a Polícia Militar empenhou 67,5% (veja quadro nesta página).
Os números foram obtidos pela Folha com a liderança do PT na Assembleia. O governo afirma que o índice vai subir até o final do ano, com a conclusão de licitações.
 
INVESTIGAÇÃO
 
Para a presidente da Associação dos Delegados de SP, Marilda Pinheiro, a falta de investimentos acabou sucateando a Polícia Civil.
A Polícia Civil é considerada a "polícia de inteligência", que deve esclarecer crimes.
A inteligência policial e a investigação são consideradas pela maioria dos especialistas como fundamentais para frear a violência, que neste ano já vitimou ao menos 4.107 pessoas, incluindo 96 PMs.
A gestão de Antonio Ferreira Pinto, que foi demitido na semana passada, recebeu críticas por ter supostamente priorizado a PM e o enfrentamento com o crime organizado em detrimento da Polícia Civil e do trabalho de investigação. O ex-secretário nega.
A prioridade para inteligência e investigação foi apontada pelo novo secretário da Segurança Pública, Fernando Grella Veira, como uma das principais mudanças previstas para sua gestão.
A Folha tenta, sem sucesso, entrevistar Grella desde que assumiu o cargo, na última quinta-feira. Ontem, após a posse dos chefes das polícias, ele também não falou.
 
 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Ginásio do Ibirapuera na "mira" da especulação imobiliária.

(do Transparência SP)
 
O governo paulista "jura" que não vai, mas acaba de encaminhar à Assembléia Legislativa um projeto de lei que autoriza o executivo a alienar uma lista grande de imóveis do Estado.
Ao todo são quase R$ 1 bilhão em imóveis públicos do Estado em inúmeras cidades paulistas. Boa parte destes imóveis em áreas nobres.
A jóia do Estado seria o conjunto esportivo do Ginásio do Ibirapuera, avaliado em R$ 168 milhões. Além disso, também encontramos gleba do Parque Ecológico de Campinas, o prédio do DER em Ribeirão Preto, o prédio de um batalhão da polícia militar, o CDP de Pinheiros, entre outros.
A assessoria de imprensa do governo diz que são imóveis apenas para fazer "lastro" para as parcerias público-privadas a serem realizadas pela Companhia Paulista de Parcerias (CPP).
 
 
 
Onde há fumaça, há fogo. Até para o blog do Juca Kfouri, conforme matéria abaixo:  



(do blog do Juca Kfouri)

Por R$ 168 milhões o governo de São Paulo quer vender o Conjunto Esportivo Constâncio Vaz Guimarães, no Parque do Ibirapuera, inaugurado em 1957, palco, por exemplo, dos Jogos Pan-Americanos de 1963, e objeto de formidável reforma no ano passado.
Trata-se de uma área de mais de 100 mil metros quadrados e com quase 90 mil metros quadrados de área construída.
A mesma tentativa, sete anos atrás, foi feita pelo mesmo governador Geraldo Alckmin, barrada, então, pela firme atuação do secretário de Esportes à época, Lars Grael.
A proposta visa irrigar a Companhia Paulista de Parcerias, com os recursos distribuídos para as Parcerias Público-Privadas no estado, e está contida no Projeto de Lei do Governador de São Paulo de número 650.
Outras 549 propriedades do governo paulista, por todo o Estado de São Paulo, estão postas à venda, segundo foi encaminhado à Assembleia Legislativa.
O texto que você lerá abaixo é do próprio governo paulista:
“O Conjunto Desportivo Constâncio Vaz Guimarães é uma obra que orgulha muito o Governo do Estado de São Paulo. Com aproximadamente 100 mil m² de área, é um dos maiores e mais equipados complexos desportivos da América Latina.
Palco da realização de inúmeros eventos esportivos, culturais e de lazer, agrega uma estrutura que compreende o Ginásio Geraldo José de Almeida (mais conhecido como Ginásio do Ibirapuera), o Estádio Ícaro de Castro Mello, o Conjunto Aquático Caio Pompeu de Toledo, o Ginásio Poliesportivo Mauro Pinheiro e o Palácio do Judô.
O conjunto possui um alojamento par 340 pessoas, tem três auditórios para 300 pessoas, três salas de condicionamento físico, sala de arco e flecha, uma pequena pista de corrida, parque para recreação, três quadras oficiais de tênis, duas quadras poliesportivas descobertas e estacionamento par 550 veículos
Recebe o nome de um dos mais respeitados homens do esporte nacional: Constâncio Vaz Guimarães, advogado e procurador fiscal que dedicou 46 anos de vida ao esporte. Decatleta, profundo conhecedor do atletismo, entre outros feitos de destaque, foi nomeado presidente da delegação Olímpica nos jogos de Berlim, em 1936.
No local funciona ainda o programa olímpico Projeto Centro de Excelência, que desde sua criação em 1984 atende atletas oriundos de todo Estado em regime de internato e atendimento integral, nas modalidades de judô, atletismo, natação e voleibol.
O Conjunto Desportivo Constâncio Vaz Guimarães está localizado na Rua Manoel da Nóbrega, 1361″.
Em região altamente valorizada e às vésperas de o país receber os Jogos Olímpicos, o governo tucano quer se desfazer de um patrimônio desse quilate.
E não se trata de privatizá-lo, mas, sim, de vendê-lo, pura e simplesmente, certamente para que se construam novos espigões na congestionada cidade que não pode parar, e está parando, numa de suas poucas áreas agradáveis.
Nota do blog: A assessoria de imprensa do governo paulista, da mesma maneira agressiva com que já desmentiu até que houvesse uma onda de violência no Estado, soltou nota ao UOL onde diz em seu trecho substantivo que “a lei exige que a Companhia Paulista de Parcerias (CPP), responsável por viabilizar as parcerias, apresente garantias contratuais e financeiras – o que não significa vender os imóveis. A inclusão do Ginásio do Ibirapuera como lastro se justifica exatamente pelo valor imobiliário e atende a finalidade de dar ainda mais segurança nas operações deste tipo. Nesta lista de patrimônios do Estado também consta, por exemplo, o prédio onde está instalada a sede do Ministério Público. Será que o colunista acha que esse imóvel também está à venda? Obviamente, não está”.
Ocorre que o Projeto de Lei é textual ao dizer:
Artigo 2º – Para fins do disposto na Lei nº 11.688, de 19 de maio de 2004, fica a Fazenda do Estado autorizada a alienar os imóveis indicados no Anexo II desta lei, inclusive para destiná-los à integralização do capital social da Companhia Paulista de Parcerias – CPP, bem como utilizar o produto de sua alienação para essa finalidade.
Ou seja, uma coisa é dizer que não pretende isso ou aquilo, outra é o que se pede para ser aprovado como lei à Assembleia Legislativa: categoricamente a autorização para a alienação dos imóveis.
Talvez não se queira mesmo vender o prédio do Ministério Público.
Mas o Conjunto Esportivo já foi, como informado na nota do blog, objeto de tentativa semelhante sete anos atrás. Daí…

Escândalos e má conservação nos museus paulistas

(do Transparência SP)
As notícias vieram em momentos distintos, mas revelam os problemas na gestão da cultura no Estado de SP.
De um lado, apropriação privada na gestão de museus estaduais. De outro, a falta de conservação do "Museu do Ipiranga", na reportagem chamado de Museu Paulista, para não chamar muita atenção.
Diante destas duas matérias, como podemos caracterizar a gestão tucana na área?



Nove ex-gestores de museus de SP têm bens bloqueados

(Folha de São Paulo)
 

MARIO CESAR CARVALHO
DE SÃO PAULO
 
A Justiça determinou o bloqueio de bens de nove antigos gestores do MIS (Museu da Imagem e do Som) e do MCB (Museu da Casa Brasileira). Eles são acusados de desvios de verbas públicas que somam R$ 2,16 milhões.
Foram atingidos pelo bloqueio de bens o ex-secretário de Cultura Ricardo Ohtake (1993-1994), o arquiteto Carlos Bratke, que dirigiu o Museu da Casa Brasileira, a curadora Adélia Borges e o crítico de cinema Amir Labaki, organizador da mostra de documentários É Tudo Verdade.
O pedido do bloqueio, conforme revelado ontem pelo jornal "O Estado de S. Paulo", foi feito pelo promotor Silvio Marques, o mesmo que investigou contas no exterior de Paulo Maluf (PP-SP). Na petição, a Promotoria acusa os museus de usarem caixa dois, notas frias e empresas fantasmas para o suposto desfalque.
O MIS teria sofrido desvio de R$ 1,04 milhão; o MCB, de R$ 1,12 milhão. Os envolvidos negam ter praticado irregularidades ou desvios. Labaki disse que nunca provocou prejuízos ao erário (leia ao lado).
A Promotoria afirma que os dois museus alugavam seus espaços para eventos privados, mas o recurso não ia para um fundo do Estado, como determina a lei. Revertia para o caixa da associação de amigos da entidade.
As associações de amigos foram usadas pelos museus entre 1991 e 2006 sem ter qualquer amparo legal, de acordo com a Promotoria. Na visão da Promotoria, as associações só se tornaram entidades legais quando foi aprovada a lei das OSs (organizações sociais), que estabelece regras para parcerias entre o Estado e entidades privadas.
Entre outros eventos privados, são citados um festival de filmes de surfe promovido pela Osklen no MIS e um encontro da Microsoft no Museu da Casa Brasileira.
Num e-mail de abril de 2004, reproduzido no pedido de bloqueio à Justiça, Adélia Borges, então diretora do MCB, escreve: "Veja com a Cecília que tipo de nota precisamos para providenciar isso. Se pode ser uma nota só ou precisa de duas notas".
Rodrigo Capote - 3.abr.10/Folhapress
Museu da Casa Brasileira na av. Faria Lima,na região de Pinheiros
Museu da Casa Brasileira na av. Faria Lima,na região de Pinheiros
 
A investigação do Ministério Público aponta que o Museu da Casa Brasileira obtinha as notas frias com um funcionário de uma gráfica, chamado Marcelo Muszkat. Ele ficava com 6% do valor da nota fiscal, de acordo com a apuração da Promotoria.
A investigação sobre as supostas irregularidades começou em 2006, a partir de informações de uma funcionária do MIS. Em 2008, a Justiça autorizou a quebra de sigilo bancário dos suspeitos.
A Promotoria fez auditorias nas contas dos museus e usou dados do Tribunal de Contas do Estado, a primeira instituição que apontou problemas nas parcerias dos museus com as associações.
O Tribunal de Contas concluiu que o MIS apresentou 136 notas fiscais frias entre 2004 e 2006. No mesmo período, o MCB é acusado de usar 99 notas inidôneas para justificar gastos.

Editoria de arte/Folhapress
OUTRO LADO
O designer gráfico e gestor cultural Ricardo Ohtake classificou de surreal a acusação de que foi omisso sobre supostas irregularidades no MIS e no Museu da Casa Brasileira. "Nunca fui alertado de nada." As acusações de desvio também são improcedentes, segundo ele: "Eu botei dinheiro do meu bolso para o MIS funcionar. Ninguém roubou nada".
O arquiteto Carlos Bratke também desclassificou as acusações: "Fui diretor do Museu da Casa Brasileira de 1992 a 1995. Estão me acusando de fatos que ocorreram posteriormente. Não fiz nada de irregular".
O advogado de Bratke, Luiz Carlos Roberto, diz que após 1995 seu cliente integrou a associação de amigos do Museu da Casa Brasileira, instância que não tinha poderes sobre a gestão do museu.
O crítico de cinema Amir Labaki disse: "Contesto as acusações e tenho plena confiança de que ao fim ficará provado que tenho razão. Nenhum dos meus atos à frente do MIS acarretou qualquer prejuízo ao erário".
Aluísio Berezowski, advogado de Graça Seligman, afirma que o bloqueio de bens "é absurdo". "A Graça nunca se apropriou de nada. Ela teve os sigilos bancário e fiscal quebrados pela Justiça e nada se encontrou."
Segundo ele, sua cliente seguia à época uma política determinada pela Secretaria de Cultura do Estado, de transferir a direção dos museus para organizações sociais (entidade privada que gerencia bem público).
A Folha não conseguiu localizar os advogados dos outros gestores que tiveram seus bens bloqueados.

Má conservação ameaça fechar Museu Paulista

(O Estado de SP)

(Edison Veiga)

Prédio centenário passará por reforma estrutural no próximo ano; reboco tem caído da fachada e forro de salão cedeu 10 centímetros

As toneladas de 150 mil itens do acervo, as intempéries, os 122 anos de idade e a falta de conservação deixaram em más condições o prédio do Museu Paulista – mais conhecido como Museu do Ipiranga –, um dos mais visitados cartões-postais de São Paulo. Pedaços de reboco da fachada estão caindo e o forro de um dos principais salões cedeu 10 centímetros, determinando sua interdição.
A esses problemas soma-se uma outra questão fundamental: o prédio, que recebe 300 mil visitantes por ano, não segue normas de acessibilidade a deficientes físicos.
Um plano de recuperação do museu será executado ao longo do próximo ano e, durante as obras, a diretora Sheila Walbe Ornstein não descarta o fechamento parcial ou total da instituição. “Quando formos recuperar os salões que tiveram problemas no forro, precisaremos esvaziar essas salas cheias de mobília. Provavelmente teremos de acondicionar esse acervo no nosso salão nobre, restringindo ali o acesso”, afirma. “Durante as obras no subsolo, ficaremos sem banheiro para visitantes. Há uma situação de fechamento”, avisa.
O projeto de recuperação já foi traçado e vem sendo estudado por profissionais da Universidade de São Paulo (USP) – instituição que administra o museu – e por conselheiros dos três órgãos de proteção do patrimônio que tombaram o edifício – o Iphan, o Condephaat e o Conpresp. A próxima reunião está agendada para o dia 30.
Defeitos. Boa parte dos problemas é perceptível aos visitantes mais atentos. Trincas e rachaduras são visíveis nos cômodos internos. Do lado de fora, correntes de proteção impedem que as pessoas se aproximem da fachada por segurança, uma vez que pedaços do reboco podem cair.
A tinta usada na última pintura, em 1990, foi inadequada. “Por ser de látex, criou uma camada sintética. Com as falhas, acumula água da chuva e os tijolos se desmancham”, diz Sheila.
A primeira etapa, emergencial, deve ser iniciada em 20 dias. O subsolo, hoje em parte ocupado pelo setor administrativo, será esvaziado e passará por obras para receber os itens mais pesados da reserva técnica. Carruagens e mobiliário de madeira maciça e materiais metálicos sairão dos andares superiores, aliviando a estrutura do prédio.
No próximo ano, o museu deve tornar-se acessível, com adaptações em rampas, banheiros e catracas. No orçamento que tem em mãos, de R$ 21 milhões, a diretora contempla a modernização da segurança e da parte elétrica e a recuperação das fachadas.
Para custear as obras, ela diz acreditar também na ajuda da iniciativa privada. “A sociedade precisa se mobilizar e nos ajudar a conseguir esses recursos”, pede Sheila.
Peso
Para não sobrecarregar demais a estrutura, o museu não suporta mais de 800 visitantes simultâneos – o controle é feito na portaria.
Desafio é preparar edifício para 2022
O Museu Paulista já tem um plano para comemorar bem o 2º Centenário da Independência do Brasil, em 2022. Se depender da vontade dos atuais administradores, a instituição terá um anexo, dobrando sua área útil atual – de 6,4 mil metros quadrados – para abrigar laboratórios e reserva técnica. O prédio original seria, então, somente expositivo.
‘É preciso levar o
museu do século 19 para o século 21’
Do célebre Afonso d’Escragnolle Taunay (1876 -1958) à diretora anterior à atual, Cecília Helena de Salles Oliveira, o Museu Paulista sempre foi conduzido por historiadores. Sheila Walbe Ornstein é a primeira arquiteta a ocupar o cargo.
Sua nomeação, no primeiro semestre deste ano, pelo reitor da Universidade de São Paulo, João Grandino Rodas, não foi por acaso. Autora de sete livros e ex-vice-diretora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, Sheila tem a missão de administrar, em seus quatro anos de mandato, o Museu Paulista com cabeça, coração e talento arquitetônico.
Ela não parece ter pressa. Frisa que o trabalho precisa ser feito com a calma, o cuidado e a paciência exigidas por um centenário edifício tão maltratado. Inspira-se o tempo todo no engenheiro e arquiteto italiano Tommaso Gaudenzio Bezzi (1844-1915), autor do projeto. Reconhece que, não fosse a perícia do autor, o prédio – projetado para ser um monumento e não um museu – não teria suportado tanto tempo e peso.
Seu desafio é planejar o futuro. Colocar em prática um plano de ação que garanta a sobrevivência do edifício que guarda itens importantíssimos para a História do Brasil.
Em suas palavras, “é preciso deixá-lo, como patrimônio, no século 19, mas, ao mesmo tempo e cuidadosamente, transportá-lo para o século 21.”
Prédio já foi
projetado como monumento

Estilo renascentista
Às margens do Córrego do Ipiranga, o prédio ficou pronto em 1890. Foi obra do arquiteto e engenheiro italiano Tommaso Gaudenzio Bezzi.
Museu
O monumento foi transformado em museu em 1895 – no primeiro ano, já recebeu 40 mil visitantes. Passou a ser administrado pela USP em 1963.
Interdições
Em sua história, o museu ficou fechado apenas quatro períodos – em 1921, de 1953 a 1955, em 1961 e em 1963. A última reforma foi nos anos 1980.

Governo paulista faz "maquiagem" em trem turístico que se acidenta em Campos do Jordão

(do Transparência SP)
 
Apesar de duas matérias jornalísticas (do Estadão e do Diário de SP), a grande imprensa não apurou detalhadamente um fato importantíssimo da tragédia ocorrida com o bondinho turístico de Campos do Jordão: o mesmo havia sido reformado pelo governo estadual a poucos meses.
Apurando o assunto, podemos supor que o governo paulista, mais uma vez, maquiou o bondinho, sem que houvesse a troca dos sistemas de freios e outros componentes estruturais do equipamento.
Para os passageiros, parecia tudo maravilhoso, com o vagão reformado.
Aliás, outro episódio parecido ocorreu com uma composição da linha 3 - vermelha (Leste/Oeste)do Metrô de SP, reformada por um preço quase equivalente à compra de uma nova e, depois, envolvida em um acidente.
Os problemas da gestão tucana no Estado são inúmeros, devidamente acobertados pela mídia paulista.



Estadão - 04/11/2012

Bondinho foi reformado em julho
http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,bondinho-reformado-foi-entregue-em-julho,955574,0.htm


Domingo Espetacular - 04/11/2012

Vídeo: Três morrem e dezenas ficam feridas em acidente com bondinho no interior de SP

Os bombeiros retiraram as vítimas presas nas ferragens. O bondinho é muito usado pelos turistas que visitam Campos do Jordão. O trem saiu à tarde com direção ao município vizinho, Pindamonhangaba. Seria uma viagem de uma hora, mas a poucos quilômetros do destino, o bondinho tombou



Portal do Governo de SP - 01/07/2012
Fotos: Governador entrega novo trem para Estrada de Ferro de Campos do Jordão (EFCJ)
O governador Geraldo Alckmin esteve na manhã deste domingo, 01, na cidade de Campos do Jordão para a inauguração do novo prédio do batalhão da polícia militar do município e entrega de novos equipamentos para a estrada de ferro
O Vale - 05/11/2012
Fotos: Bondinho já havia descarrilado no mês passado
A leitora Uismara Oliveira Cardoso nos enviou duas fotos, que teriam sido tiradas no mês passado na Estrada de Ferro Campos do Jordão, a mesma onde ocorreu o acidente sábado à noite, que culminou com a morte de três pessoas.
Pelas fotos, é possível checar que o bondinho também descarrilou em um trecho da estrada de ferro.
Naquela ocasião, no entanto, felizmente o episódio não trouxe cosequências mais graves aos passageiros e aos funcionários da EFCJ

G1 - 03/11/2012

Há exatamente um ano, Alckmin anunciou investimento na ferrovia

Promessa de aporte de R$ 4,1 milhões foi feita em 2 de novembro de 2011.
Recursos seriam para a compra de máquinas e equipamentos



G1 - 04/11/2012

'Acidente com trem não foi caso isolado', diz funcionário da EFCJ

Informação é de funcionário da empresa, com sede em Pinda.
Só neste ano foram registrados seis acidentes na ferrovia



G1 -05/11/2012

Ministério Público vai investigar funcionamento da Estrada de Ferro

Promotoria de Pindamonhangaba apura aplicação de recursos na ferrovia.
Cobertura feita pelo G1 neste fim de semana será utilizada no processo



ASP - 05/11/2012

Vítimas do bonde culpam o freio pela tragédia

Sobreviventes de acidente que matou três mulheres na Serra da Mantiqueira começaram a ser ouvidos



Folha - 05/11/2012

Vídeo mostra passageiros saindo de bonde que descarrilou no interior de SP; veja



Leia também:




quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Coronel Telhada, da Rota, eleito vereador pelo PSDB paulistano, ameaça jornalista da Folha.

(do Transparência SP)
 
Imagine se fosse algum deputado ou vereador do PT ameaçando um reporter da Folha.
Pois bem, o Coronel Telhada, ex-comandante da Rota, vereador eleito pelo PSDB/SP, provocou uma onda de ameaças, através do Facebook, a um dos mais respeitados reporteres em segurança pública do país - André Camarante - que trabalha no jornal Folha de SP.
Esta é a liberdade de expressão que o jornalismo tupiniquim defende: se a violência vem da direita, não existem manchetes. Mais ainda, os principais veículos de comunicação acobertam a situação.
Este exemplo é um dos mais bem acabados de como andam a segurança pública e a comunicação no Brasil, e mais especificamente em São Paulo.
O rompimento deste silêncio veio através da jornalista Eliane Brum, que relata a situação e entrevista o reporter.
 
O LADO ESCURO DA GRANDE METRÓPOLE
 
Por Eliane Brum
 
Um repórter ameaçado de morteAndré Caramante, um dos mais respeitados jornalistas brasileiros na área da segurança pública, foi obrigado a mudar de país e esconder-se. Em entrevista, ele conta o que a situação de exceção vivida por ele e por sua família revela sobre a intrincada relação entre poder e violência
 
Em 14 de julho, André Caramante, repórter da Folha de S.Paulo, assinou uma matéria com o seguinte título: “Ex-chefe da Rota vira político e prega a violência no Facebook”. No texto, de apenas quatro parágrafos, o jornalista denunciava que o coronel reformado da Polícia Militar Paulo Adriano Lopes Lucinda Telhada, candidato a vereador em São Paulo pelo PSDB nas eleições do último domingo, usava sua página no Facebook para “veicular relatos de supostos confrontos com civis”, sempre chamando-os de “vagabundos”. Em reação à matéria, Telhada conclamou seus seguidores no Facebook a enviar mensagens ao jornal contra o repórter, a quem se referia como “notório defensor de bandidos”. A partir daquele momento, redes sociais, blogs e o site da Folha foram infestados por comentários contra Caramante, desde chamá-lo de “péssimo repórter” até defender a sua execução, com frases como “bala nele”. Caramante seguiu trabalhando. No início de setembro, o tom subiu: as ameaças de morte ultrapassaram o território da internet e foram estendidas também à sua família.
O que aconteceu com o repórter e com o coronel é revelador – e nos obriga a refletir. Hoje, um dos mais respeitados jornalistas do país na área de segurança pública, funcionário de um dos maiores e mais influentes jornais do Brasil, no estado mais rico da nação, está escondido em outro país com sua família desde 12 de setembro para não morrer. Hoje, Coronel Telhada, que comandou a Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) até novembro de 2011, comemora a sua vitória nas eleições, ao tornar-se o quinto vereador mais votado, com 89.053 votos e o slogan “Uma nova Rota na política de São Paulo”.
O que isso significa?
Os 13 anos em que André Caramante cobre a área de segurança pública são marcados pela denúncia séria, resultado de apuração rigorosa, dos abusos cometidos por parte da polícia no estado de São Paulo. A relevância do seu trabalho foi reconhecida duas vezes pelo Prêmio Folha de Jornalismo. Caramante já denunciou sete grupos de extermínio formados por policiais militares e civis, assim como por ex-policiais. Mantém sua própria planilha na qual registra os mortos pela polícia. E faz a denúncia sistemática da figura amplamente difundida da “resistência à prisão” como justificativa para execução, em geral dos suspeitos mais pobres. Por sua competência, Caramante ganhou o respeito da sociedade interessada em uma polícia eficiente, com atuação pautada pelo cumprimento da lei – e o ódio de uma minoria truculenta, os maus policiais, tanto militares quanto civis, e daqueles cujos interesses e projeto de poder estão ligados a eles.
Antes de ser jornalista, Caramante quis ser jogador de futebol. Morador da periferia de São Paulo, comprou a primeira chuteira vendendo papelão. Era “um meia-direita dedicado”, na sua própria avaliação, e usou a chuteira com brio nas peladas de várzea e nas peneiras na Portuguesa, no Novorizontino e no Palmeiras, clubes nos quais chegou a treinar nas categorias de base. A necessidade de ajudar com as despesas da casa o despachou para a arquibancada. Em especial a da Vila Belmiro, por um amor incondicional pelo Santos herdado do pai.
Aos 11 anos, Caramante começou a trabalhar como camelô, vendendo chocolates e sacolas no Brás, em São Paulo. Mais tarde, aos 17, o estudante de escola pública pagou a faculdade de jornalismo da Uniban com o salário de office-boy e com os vales-transporte que economizava fazendo o serviço a pé. “Não sabia se a faculdade era boa ou ruim, não entendia dessas coisas, apenas sabia o que queria fazer”, conta. “O livro Rota 66, de Caco Barcellos, tinha me mostrado o que era jornalismo.”
Em seu livro Rota 66 – a história da polícia que mata (Record), Caco Barcellos, um dos grandes nomes do jornalismo brasileiro, hoje na TV Globo, investigou o trabalho da Rota entre as décadas de 1970 e 1990. E provou que ela atuava como um aparelho estatal de extermínio, responsável pela execução de milhares de pessoas. A reação às denúncias obrigou o repórter a passar um período fora do Brasil, devido a ameaças de morte. Duas décadas depois do lançamento do livro que o inspirou, Caramante vive uma situação semelhante.




A notícia de que ele estava vivendo escondido, com a família, vazou na semana passada, em matéria da Revista Imprensa. Até então, Caramante pretendia manter o fato em sigilo. A decisão de esconder-se com a família foi difícil para o repórter que nunca quis virar notícia – e que sempre evitou ser fotografado. Enquanto era alvo único das ameaças de morte, Caramante manteve uma rotina normal. O jornalista só aceitou se mudar para um destino secreto quando sua família passou a ser ameaçada. Mesmo assim, para ele é ponto de honra seguir com seu trabalho de reportagem. Pela internet, envia informações ao jornal com frequência. E segue assinando matérias na área da segurança pública.
Quando um repórter é obrigado a mudar de país e se esconder com a família por fazer bem o seu trabalho e prestar um serviço à população, ao fiscalizar os órgãos de segurança pública, este não é um problema só dele – mas da imprensa, que tem o dever de informar, e da sociedade, que tem o direito de ser informada. É disso que se trata.
Na entrevista a seguir, feita por email entre sexta-feira e domingo, André Caramante, 34 anos, fala sobre a situação de exceção que ele e sua família estão vivendo, mas principalmente sobre as complexas relaçõesentre violência e poder que a tornaram possível.
Em 14 de julho, você publicou na Folha de S.Paulo uma matéria com o seguinte título: “Ex-chefe da Rota vira político e prega a violência no Facebook”. Você se referia ao coronel reformado Paulo Adriano Lopes Lucinda Telhada, que comandou a Rota, em São Paulo, até novembro de 2011, e, nestas eleições, disputou uma vaga para vereador pelo PSDB. O que aconteceu a partir desta matéria que o levou a, dois meses depois, ter de esconder-se com a família?
André Caramante -
Cubro segurança pública há 13 anos, então, muito dessa situação não é exatamente novidade. Nestes 13 anos, sempre mantive minha lupa sobre os abusos cometidos por policiais, especialmente no que diz respeito à letalidade. Considero legítimo que a sociedade possa fiscalizar o Estado, especialmente seu braço armado. Não podemos considerar eficiente uma polícia que mata tanto quanto a do estado de São Paulo. Entre 2006 e 2010, a Polícia Militar de São Paulo matou nove vezes mais do que todas as polícias dos Estados Unidos juntas. A cultura da nossa polícia militarizada permite que se mate sem que se conheça sequer a identidade do "oponente". É tão normal e aceitável quanto utilizar uma figura jurídica inexistente para preencher o boletim de ocorrência – a "resistência (à prisão) seguida de morte". A morte do empresário
Ricardo de Aquino por policiais militares no bairro Alto de Pinheiros (em São Paulo) colocou a questão na agenda da mídia e das autoridades alguns meses atrás. Como ele, vários outros foram vítimas dessa cultura e do mau treinamento. É óbvio que alguns policiais agem na ilegalidade e a maioria age dentro da lei. Também faço um trabalho consistente de denúncia de grupos de extermínio formados por policiais militares e civis e ex-policiais civis e militares, tendo revelado ao menos sete deles. São grupos que, ao exemplo das milícias do Rio, tentam controlar as atividades ilícitas na cidade – máquinas caça-níquel e tráfico de drogas, às vezes cruzando o caminho do PCC – e geram mortes. Há grupos bem estruturados e com braços de inteligência. Um deles, inclusive, planejou a morte de um integrante do alto escalão do governo paulista, sem que tenha conseguido levar a cabo a ação.Meu trabalho de denúncia também abrange a corrupção na Polícia Civil. Hoje, as coisas se dividem mais ou menos assim no Estado de São Paulo: alguns integrantes da PM cometem violência e alguns da Civil escorregam na corrupção. São questões totalmente relacionadas a poder e dinheiro. Em dezembro do ano passado, publicamos uma investigação da Polícia Federal que mostrava policiais civis cobrando grandes valores para liberar da prisão suspeitos de tráfico de drogas. Somadas, as propinas chegavam a R$ 3 milhões. É uma conduta isolada? Esquemas assim não surgem do nada. É da cultura da instituição, e são as pessoas que constroem a cultura organizacional. Mudar não é uma questão de ser fácil ou difícil, mas de não ser interessante para as pessoas que estão lá.
Você vem denunciando essa situação há bastante tempo, mas só agora teve de esconder-secom sua família por causa de ameaças de morte. O que aconteceu?
Caramante –
O que houve foi não digo o surgimento, mas a publicidade e o crescimento exponencial de um clima favorável à intimidação, no qual pessoas sentiram-se à vontade, ou mesmo incitadas, a disseminar "avisos". A partir da matéria sobre o que estava acontecendo no Facebook houve um acirramento dos ânimos de quem antes já me via como inimigo, além do crescimento quantitativo dos que mantêm os olhos em mim e no meu trabalho de uma forma negativa.Houve uma onda de comentários no Facebook, no Twitter, em blogs e no site da Folha que foram desde "péssimo repórter" até "bala nele". Era só "ativismo de sofá", de gente que só despeja frases no teclado do computador? Provavelmente.Depois, alertas de caráter dúbio – "Quando acontecer algo com alguém da sua família...", "Quando você for sequestrado..." – surgiam nos espaços de comentários do site da Folha em qualquer reportagem que eu escrevesse e até naquelas em que não tive participação, mas que traziam denúncias contra membros das polícias. Também orquestraram o envio de diversas cartas contra mim, enquanto profissional, para a Folha.Após pouco mais de um mês de bombardeio digital, as ameaças tornaram-se mais concretas, com fatos atualmente sob investigação das autoridades competentes.
Que fatos são estes?
Caramante –
Não falo de um fato, mas de uma série, que se iniciou dias após aquela onda nas redes sociais. Foram ligações, comprovações por fontes altamente confiáveis,de que estavam levantando informações de familiares, motos em trajetos curiosamente iguais aos meus. Não acho possível dimensionar a gravidade do risco, e também chegou-se a um ponto em que não valia mais a pena ficar avaliando. Decidi ouvir gente mais experiente do que eu e, em conjunto com o jornal, foi tomada uma decisão: trabalho à distância.
Não estou fisicamente na redação desde o início de setembro, sem que tenha saído da ativa. Esta é uma situação em que o risco físico toma a cena, mas certamente ele não é o único. Venham de onde vierem, a ameaça e a intimidação têm o objetivo de desestabilizar, tirar de cena. Jogam com o risco psicológico também, testam quão boa é a sua cabeça e quão forte é a sua corrente.
Qual é o papel do Coronel Telhada, ex-comandante da Rota, nesta série de ameaças?
Caramante –
Em sua página, o coronel reformado começou a divulgar relatos de confrontos entre PMs da Rota e civis – estes sempre chamados de "vagabundos” –, além de divulgar fotos de pessoas que, segundo ele, eram suspeitos de crimes. Fiz um texto objetivo, relativamente curto, sobre isso. No dia da publicação no jornal, 14 de julho, ele postou no Facebook uma mensagem na qual me acusava de "defender abertamente o crime" e pedia uma mobilização contra mim. A conduta desse senhor deflagrou uma onda de tentativas de intimidação, de incitação à violência contra um jornalista – um profissional que apenas retratou o que o próprio coronel reformado registrou publicamente na rede social. Não estou dizendo que ele quis ou que ele não quis incitar atos violentos. Estou dizendo que acabou incitando.
Quem efetivamente está ameaçando você? E quais foram as ameaças?
Caramante –
De onde vejo, apontar um ou outro possível autor pode dar grande margem a erro. Tenho minhas suspeitas, mas não cometeria o equívoco de acusar sem provas. Creio que haja dois tipos de ameaça. A primeira se aproxima do "ativismo de sofá", de quem escreve no computador algo que jamais cumprirá. Os autores deste tipo de ameaça não são tão desconhecidos assim, e não é tão difícil encontrá-los nos canais digitais. A segunda, esta sim grave, é a ameaça de quem considera a possibilidade de agir. Aqui estão desde admiradores de policiais alvos de reportagens, pessoas que pouco têm a perder e vivem com parâmetros de raciocínio e moral diferentes dos nossos, até outros que há tempos me têm como um inimigo e podem aproveitar justamente esta visibilidade do caso do Facebook para tentar algo e "colocar na conta" de outro. O caso do Facebook, além de ser apenas uma parte da história, pode ser usado por outros para acobertar eventuais retaliações. Mas, veja, isto é o que eu deduzo com base na minha experiência, não há qualquer base de pesquisa ou de investigação científica.
O que você está dizendo é que pessoas que se ressentem há muito tempo com suas denúncias de abusos cometidos pela polícia estariam se aproveitando do caso do Facebook para se vingar e desviar a responsabilidade para o Coronel Telhada?
Caramante –
Sim, é uma possibilidade.
Quando as primeiras ameaças se tornaram públicas, você disse que continuaria a fazer o seu trabalho. Imagino que deve ter sido difícil tomar a decisão de se afastar da redação. Como esta decisão foi tomada?
Caramante –
É importante esclarecer que o termo "afastamento" não é apropriado para o meu caso. Continuo exercendo minhas atividades profissionais, onde quer que eu esteja. Não estar fisicamente na redação me causa impedimentos que são irrisórios frente à necessidade atual de garantia da integridade, minha e da minha família.
Quando você deixou de trabalhar na redação?
Caramante –
Desde o início de setembro. Os advogados do jornal encaminharam às autoridades uma solicitação de investigação sobre as ameaças. Alterei completamente minha rotina e minha localização.
Foi difícil?
Caramante –
Sou trabalhador desde os 11 anos e não tenho dúvidas quanto à profissão que escolhi. A decisão de estar fisicamente ausente da redação não foi nada fácil. Particularmente, via este passo como um sinal de recuo, um erro do ponto de vista do meu ideal e mesmo de estratégia em relação a quem tenta enfraquecer o trabalho da imprensa. O que fizemos, então, foi arquitetar uma ausência que fosse apenas física, com uma operação que permitisse que seguíssemos em frente. Existem inúmeras maneiras de fazer reportagem.
Qual foi a reação da sua família e como eles estão vivendo esse momento?
Caramante –
Estão todos cientes e bastante atentos. Não é fácil estar ausente, mas não creio que seria muito melhor estar presente e vivendo com sombras. Meus filhos percebem a situação incomum que vivem atualmente, mas ignoram essa história toda. Felizmente, eles sentem-se seguros onde pai e mãe estão – não importa onde. Minha rede familiar está permeada pelo estresse, mas ela é muito forte. Sempre foi, desde muito antes de toda essa situação. Além disso, a corrente formada por colegas de profissão e entidades daqui e de fora também deixou claro que este não é um problema só meu. Entidades como Repórteres Sem Fronteiras, Knight Center of Journalism (vinculado à Universidade do Texas), Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, Instituto Sou da Paz, coletivo Sindicato É Pra Lutar e movimento independente Mães de Maio se manifestaram publicamente em apoio à minha atuação e ao direito de informar.
É isso que está em jogo, o direito de informar?
Caramante –
É uma questão ligada ao direito de informar e de ser informado, e meus companheiros de profissão sabem do que falo. Há, atualmente, no estado de São Paulo, uma grande preocupação por parte de autoridades da segurança pública de tentar evitar que muitos fatos sejam tornados públicos pela imprensa. Por conta disso, funcionários públicos que as autoridades acreditam manter contato com jornalistas passam a ser alvo de perseguição nas instituições às quais pertencem. Muitas vezes, essas perseguições são feitas com base apenas no "achismo".
Que fatos são estes, que as autoridades da segurança pública não querem que se tornem públicos?
Caramante –
Qualquer dado que não conste do relatório oficial publicado mensalmente no site da secretaria. Não é exagero. Falo de qualquer dado mesmo. Basta perguntar a quem cobre a área. Não é de hoje. Sempre foi assim. No estado de São Paulo, jornalistas são impedidos de consultar boletins de ocorrência, um documento público. Tudo – absolutamente tudo – tem de passar pelas canetas das assessorias de imprensa da Secretaria e da Polícia Militar. É uma operação extremamente centralizada e que visa impedir o repórter de ir a uma delegacia e obter informações sobre uma ocorrência.
Por quê?
Caramante –
Vejo como uma tentativa de construir uma realidade que não existe aqui, como se vivêssemos na Suécia. A proibição do acesso a boletins de ocorrência integra uma estratégia de forte controle de informações. "Só sai o que eu quero." Não importa a relevância do dado, esta é a diretriz. Delegados só dão entrevistas mediante autorização de assessores de imprensa. É meio estranho que uma autoridade seja submetida a esse tipo de imposição para tentar controlar a informação.
Esta foi a primeira vez que você foi ameaçado de morte?
Caramante –
Não. Como vários outros colegas, já passei por situações semelhantes. Ouvi pelo telefone frases como "Cuidado, muita gente morre em assalto por aí", seguida por meu endereço completo. Tempos atrás, policiais à paisana fotografaram minha família durante um passeio.
Você costuma denunciar os abusos cometidos pela polícia, especialmente contra os moradores das periferias de São Paulo e da Grande São Paulo. Você se considera, hoje, nesta situação, uma vítima da polícia?
Caramante –
Não me considero vítima de nada. Tenho plena consciência de que não posso e não quero ser notícia. Sou contratado por um jornal para contar as histórias das outras pessoas, para fiscalizar um determinado segmento do poder público. E a minha preocupação é sempre esta: contar a história do próximo, registrar os fatos, levar a notícia para quem lê a Folha de S.Paulo. As páginas de um jornal marcam a história de um país. Eu sou uma peça dessa engrenagem que imprime a história no papel do jornal. A exposição desses últimos fatos me trouxe tristeza porque não é o que busco como repórter. Aí vão perguntar: “E por que você está dando entrevista?”. Estou dando entrevista porque, do muito que foi dito sobre a minha pessoa, pouco foi dito por mim. Porque quero esclarecer que não estou "afastado". Afastamento dá a ideia de punição, de suspensão, e nunca houve nada nesse sentido da parte do jornal. Pelo contrário: sanamos a demanda urgente relativa à garantia da integridade e ao mesmo tempo planejamos a continuidade do trabalho. E mais: não existe isso de perseguir a Polícia Militar ou a Polícia Civil com meu trabalho. O que penso é que ninguém quer ter nessas instituições pessoas que não façam jus à condição de representantes do Estado.
Já entrevistei muitas pessoas ameaçadas de morte, algumas delas ameaçadas de morte por policiais, de diferentes estados. Minha percepçãoé de que estas últimas sentem um nível de desamparo maior, na medida em que, se aqueles que deveriam protegê-las, em vez disso ameaçam a sua vida, para quem então pedem ajuda? Sem contar que membros da polícia, por disporem do aparato do Estado, têm meios para comprometer a credibilidade da vítima, “plantando” falsas provas. Como você percebe isso?
Caramante –
Quando você tem indicativos de que alguns dos representantes armados do Estado querem te desestabilizar, com certeza, a reflexão é sempre essa: para quem recorrer, como agir? Muitas vezes, essas mesmas pessoas tentam desmoralizar seu trabalho e sua conduta fora do campo profissional, mas tenho tentado me manter centrado. Converso com repórteres amigos para dividir alguns pensamentos e pensar em maneiras de me manter firme na caminhada.
Por que o estão ameaçando? Que “ameaça” você representa para que ameacem a sua vida? E por que agora, neste momento?
Caramante –
Como te falei, não é de agora. É uma coisa que ficou mais acentuada. Pode ser que tenha alguma relação com o período eleitoral ou com outros interesses que ainda não consigo afirmar quais são. Um deles, por exemplo, pode ser a necessidade que muitos têm de manter o poder ou de chegar até o poder.
Quem? Pode explicar melhor?
Caramante –
Não posso nomeá-los, pois aí já entraremos em informações referentes aos bastidores das polícias, e esses meandros estão muito ligados às minhas fontes e às minhas apurações. Hoje, em São Paulo, a questão da polícia vai além dos muros dessas instituições. A cidade nunca esteve, em período democrático, tão militarizada. Trinta das 31 subprefeituras ganharam comando de PMs da reserva na gestão Kassab. Com a criação da operação delegada, os policiais militares hoje atuam oficialmente não apenas para a corporação, mas também para a prefeitura – é o bico legalizado. Vemos então que as frentes de poder estão crescendo, e há muita gente na disputa. Sem contar os cargos na Câmara Municipal.
Por que isso está acontecendo? Por que, por exemplo, 30 das 31 subprefeituras de São Paulo ganharam comando de PMs da reserva nesta gestão?Como você caracterizaria esse projeto de poder?
Caramante –
Esse processo ganhou corpo quando o coronel (agora reformado) da PM Álvaro Batista Camilo, também candidato a vereador, pelo PSD, se aproximou do prefeito Kassab, na época em que era comandante-geral da PM. Como é sabido, Kassab vem marcando sua gestão com uma postura de cerceamento. Já são notórias as tentativas de proibição de sopões a moradores de rua, de saraus na periferia, da feira da praça Roosevelt, no centro de São Paulo, e outras mais.
O que o fato de um repórter de um dos maiores jornais do país ser ameaçado de morte revela sobre a violência no estado de São Paulo?
Caramante –
É uma questão que não diz respeito somente à violência. Esta é a parte tangível de todo o contexto que citei anteriormente. A relação polícia X poder é atualmente um ponto muito importante. Desde a abertura política, talvez seja este o momento em que São Paulo mais tenha a influência de policiais militares. Com poder em jogo, os ânimos se acirram, em qualquer área.


Por que agora? E o que está em jogo?
Caramante –
Estamos em um momento propício por conta da já citada aproximação sem precedentes (da polícia) com outras esferas do poder público. Muitos oficiais da PM notaram, e agora tentam dar vazão a isso, que há outras e importantes áreas para onde estender seu campo de atuação – e de poder.
Você cobre a área policial há 13 anos. Documentou, como repórter, a ascensão do PCC. Você costuma dizer que vivemos numa guerra. Por quê? Como é essa guerra e em que momento dessa guerra estamos hoje?
Caramante –
É uma guerra entre o grupo criminoso PCC e as forças de segurança do Estado. O PCC é forte porque controla o tráfico de drogas no estado de São Paulo. É inegável o fato de o estado de São Paulo, desde 1999, ter conseguido baixar suas taxas de homicídios dolosos (intencionais). Essa queda, porém, é fruto de controle duplo: se deve tanto a progressos na Segurança Pública quanto ao comando do PCC. Em muitas situações, é o PCC quem decide quem morre em São Paulo, nos chamados tribunais do crime. Hoje, outubro de 2012, a guerra está mais acirrada entre o PCC e os policiais militares da Rota, considerada uma tropa de elite da PM paulista e que conta com 820 integrantes. Investigações contra o PCC antes feitas pela Polícia Civil, que tem essa atribuição pela lei, foram remetidas à Rota, que tem função de policiamento preventivo, ou seja, trabalhar para evitar que o crime ocorra.Estou dizendo isso porque defendo criminosos e quero dar uma chance a eles? Não. Falo porque é ilegal. Quem investiga é a Polícia Civil. Há aí uma nítida tentativa de empoderar ainda mais os integrantes da Rota. É o Estado agindo ilegalmente.
Por quê?
Caramante –
Isso é um reflexo da atual cúpula da Secretaria da Segurança Pública, que tem um histórico de relacionamento intrínseco com a Rota. Nos primeiros escalões da segurança pública paulista, também, impera uma certa desconfiança quanto à atuação de parte da Polícia Civil nas investigações sobre o PCC. Fala-se em corrupção.
Na semana passada, a Folha publicou que arquivos da facção PCC revelam atuação em 123 cidades de São Paulo, com 1.343 homens em todas as regiões do estado. O governo de São Paulo tentou minimizaro impacto das informações e o poder do PCC. O governador, Geraldo Alckmin, afirmou que “há muita lenda” sobre facções criminosas no estado de São Paulo. O secretário da Segurança Pública, Antonio Ferreira Pinto, declarou: “A facção é bem menor do que dizem. Não chega a 30 ou 40 indivíduos que estão presos há muito tempo e se dedicam ao tráfico. Nós temos asfixiado esse tráfico com grandes prisões”. O coronel da Polícia Militar Marcos Roberto Chaves da Silva, comandante do policiamento da capital, disse que existe “folclore” nas informações sobre o PCC. Qual é a verdade?
Caramante –
Curioso como esse folclore é alinhado à realidade. No mês passado, por exemplo, a Rota matou nove pessoas envolvidas em um “tribunal do crime”, um julgamento no qual um homem suspeito de estuprar uma menina teria sua vida decidida pelos criminosos do PCC. Um dos nove mortos pela Rota era o “réu” do partido do crime, como os policiais chamam o PCC. Para justificar a ação, o governo disse que todos eram muito perigosos, que integravam o PCC. Passado o calor do acontecimento, o governo voltou à postura habitual de minimizar a importância, o tamanho e o poder do grupo. Se são apenas 30 ou 40 indivíduos, as oito mortes no mês passado reduziram significativamente o PCC. É isso o que vemos quando policiais militares são mortos quando estão de folga, como tem ocorrido constantemente em São Paulo? Será que o PCC deixou de decidir quem vive ou quem morre durante um “tribunal do crime”, quase sempre via telefones celulares usados por criminosos que estão presos e, na teoria, deveriam estar sem comunicação com as ruas? Quem vive na periferia de São Paulo sabe bem como as coisas são.
E como as coisas são? Como é o cotidiano de quem vive na periferia com relação ao PCC e à Rota?
Caramante –
O PCC domina os pontos de tráfico de drogas em São Paulo. Para evitar a presença das polícias, tenta corromper alguns de seus integrantes e também busca evitar crimes nas redondezas dos pontos de tráfico, principalmente homicídios. No meio disso, quem não é nem do PCC, nem da polícia, assiste a tudo em silêncio, esperando que não "sobre" para si.
O governador Geraldo Alckmin trocou o comando da Rota, no final de setembro. Entre as razões, estaria a divulgação de que o número de pessoas assassinadas pela tropa aumentou 45% nos primeiros cinco meses deste ano, comparado ao mesmo período do ano passado. Qual é a sua opinião sobre a Rota? Ela deveria acabar?
Caramante –
Não só a Rota, mas toda a Polícia Militar. A PM tem uma estrutura que desconhece meritocracia e privilegia uma variação do nepotismo. Policiais dos escalões mais baixos são usados como degrau para filhos de oficiais que estão no topo da pirâmide. É como se o filho do coronel fosse, desde sempre, o coronel de amanhã, e o filho do praça já nascesse sabendo que jamais será oficial. Há exceções que o governo pode vir a bradar, claro, mas a regra é mais ou menos essa.Quantos oficiais foram mortos pelo PCC?Nenhum. É óbvio que não tem de morrer nem o official, nem o praça. Mas, hoje, só morre aquele trabalhador que está na linha de frente e também vive na periferia de São Paulo.Quem cobre segurança pública em São Paulo também sabe que os policiais da Rota saem às ruas com um ímpeto diferenciado e, às vezes, alguns deles cometem excessos. É o caso da morte do representante comercial Paulo Alberto Santana Oliveira de Jesus em Osasco, na Grande São Paulo, em setembro de 2011. Ele foi morto em casa, desarmado e com as mãos para trás. Em maio deste ano, das mortes de seis suspeitos de integrar o PCC na zona leste de São Paulo, um deles foi levado a uma rodovia e executado. Em ambas as situações, foi forjado um confronto armado, segundo dados apresentados por promotores. As seis mortes na zona leste são tidas como estopim para o atual acirramento da violência entre PCC e Rota.
Me parece curioso, para dizer o mínimo, que um repórter tenha de se esconder para proteger sua vida após ter denunciado que um candidato a vereador pelo PSDB e ex-comandante da Rota disseminava a violência no Facebook e ninguém, de nenhum partido, tenha falado disso durantea campanha. Você tem alguma hipótese para esse silêncio?
Caramante –
No fim de setembro, um candidato a vereador em São Paulo, assim como esse ex-chefe da Rota, pediu a impugnação da candidatura dele e alegou que esse senhor aparecia em sua propaganda política fardado, o que não é permitido pela lei eleitoral. Esse mesmo candidato também foi alvo da ira dos simpatizantes do ex-chefe da Rota e recebeu ameaças. A promotoria eleitoral também pediu, na semana passada, a impugnação da candidatura desse PM reformado e alegou que ele utilizou sua página no Facebook para incitar a violência.
Por que você se tornou repórter de polícia?
Caramante –
Porque quem tem a obrigação de nos defender não pode, sob hipótese alguma, atentar contra nós. Também queria que meu pai tivesse o orgulho de ver seu sobrenome no jornal por uma causa justa.Sempre admirei o trabalho de repórteres como ( Caco) Barcellos. Há histórias e situações que precisam ser contadas. Admiro muito, também, José Hamilton Ribeiro, mestre na arte de contar histórias. Ouvi palavras de apoio dos dois recentemente. As de Barcellos recebi com reverência. O tenho como meu maior exemplo. As de seu Zé Hamilton, com emoção. Me pegou desprevenido. Me marcou.Quero agradecer cada mão estendida e cada palavra de apoio que foi dita em nome da garantia do direito de informar e ser informado.
“Repórter de polícia” ainda é uma boa definição para jornalistas como você?
Caramante –
Acredito que o termo “repórter de polícia” deixou de existir. Hoje, cobrimos segurança pública e, por conta de uma evolução da cobertura nessa área, que deixou de ser tão vinculada às autoridades, como era no passado, somos repórteres de segurança pública.
E qual é a importância de se cobrir a área de segurança pública num país como o Brasil?
Caramante –
É um tema intimamente ligado ao cotidiano das pessoas, e ainda temos muito a evoluir tanto no combate à criminalidade comum quanto à de parte das forças de segurança.
Você monitora o número de pessoas mortas pela polícia. Quantos foram mortos até hoje no estado de São Paulo?
Caramante –
Sim, monitoro porque o jornal para o qual trabalho dá atenção especial para a questão da letalidade policial. Tenho meu próprio sistema de dados, no qual registro todas as mortes cometidas por policiais militares. Estes números não batem com os oficiais. A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo divulga em sua página na internet apenas as chamadas "resistências seguidas de morte", mas há outros casos que entram na vala comum dos homicídios dolosos cometidos por qualquer cidadão. Minha contabilidade mostra que, entre 2005 e agosto deste ano, policiais militares mataram 4.358 pessoas no estado. Destas, 3.401 foram em “resistência(à prisão) seguida de morte” – figura jurídica inexistente, repito – e 957 em homicídios dolosos, que vão desde brigas em bar, no trânsito, casos conjugais, até mortes como a do empresário Ricardo de Aquino. São 47,3 mortos por PMs a cada mês. Ou seja: 1,5 a cada dia. Este é o retrato de uma Polícia Militar extremamente letal e que precisa passar por reformas o quanto antes.
Em que medida as relações entre o aparato de repressão do Estado e a população explicitam a desigualdade e as fissuras da sociedade brasileira num estado como São Paulo?
Caramante –
A Polícia Militar que atua dentro do perímetro do rodízio de veículos (de São Paulo), o chamado centro expandido, não é a mesma que atua na periferia. Temos duas polícias militares para cuidar da mesma cidade, e cada uma delas trata os cidadãos de maneira diferenciada, isso de acordo com o CEP da pessoa. Muitas vezes, policiais são mandados à periferia como forma de punição dentro do jogo de poder que não está nos manuais da corporação. Então, já vai para lá com um sentimento diferenciado. Recentemente, pesquisadores mostraram, com base em dados da Secretaria Municipal da Saúde, que 93% dos mortos pela Polícia Militar moravam na periferia de São Paulo. O estudo teve como base os anos entre 2001 e 2010. No período, dos mortos por PMs, 54% eram pardos ou negros.
Hoje há programas de TV que cobrem a área policial, nos quais suspeitos são tratados por jornalistas como condenados – e condenados sem direito algum –, marcas de tortura em detidos e presos são ignoradas e apresentadores incitam a violência da sociedade contra “vagabundos”. Você acha que esse tipo de imprensa colabora para que jornalistas como você, que trabalham com seriedade e denunciam também os abusos cometidos pela polícia, sofram ameaças?
Caramante –
São profissionais da imprensa que recebem altos salários para fazer o que fazem. Eles são experientes e, creio, no fundo sabem que somente a Justiça pode condenar ou inocentar algum suspeito de determinado crime. Estão ali por cifras altas. É a mesma situação de um profissional de jornalismo que abandona a carreira numa redação para ser assessor e ganhar R$ 1 milhão por seis meses de trabalho numa campanha política. São opções e temos de respeitar quem as toma. Mas essas pessoas também têm de respeitar quem não pensa como elas.
Como é estar no lugar de vítima para você, que tanto denunciou a violação de direitos humanos dos mais pobres e indefesos?
Caramante –
Vítima é a dona Maria da Conceição, mãe do Antonio Carlos da Silva, o
Carlinhos, portador de deficiência mental que foi morto por policiais militares que integram o grupo de extermínio “Highlanders”, segundo a Polícia Civil e a Promotoria. Ele teve a cabeça e as mãos arrancadas após ter sido morto porque andava na rua e tinha dificuldades de comunicação.
Você pode contar melhor esta história?
Caramante –
Carlinhos foi morto em outubro de 2008, na periferia da zona sul de São Paulo. Estava perto de casa quando foi obrigado a entrar em uma viatura da Polícia Militar que fazia ronda no local. Vizinhos assistiram à cena e relataram à família. Imediatamente, a mãe, dona Maria da Conceição dos Santos, a irmã, Vânia Lúcia, e o pai começaram a procurá-lo. Poucas horas depois foram até o 37º Batalhão, onde ouviram da boca dos PMs – que, segundo a Polícia Civil e a Promotoria, mataram seu filho – que não o tinham visto. Encontraram o corpo de Carlinhos, decapitado e com as mãos arrancadas, em uma cidade vizinha. Ele, que era portador de necessidades especiais, tinha dificuldades para se comunicar.
Uma das maiores dificuldades da situação que você está vivendo parece ser o fato de ter virado notícia. Por quê?
Caramante –
Para começar, nunca me vi numa situação assim. Não é para isso que decidi ser repórter. A questão da exposição parece parte de uma realidade paralela, não se encaixa na minha trajetória. Optei por sempre passar despercebido.Quero poder continuar sentando numa delegacia sem que ninguém saiba quem eu sou.
Imagino que você tenha medo em alguns momentos ou o tempo todo. Como lida com isso?
Caramante –
O medo pode ser uma ótima ferramenta para aguçar os instintos. Sim, pode ser devastador também. Tento utilizá-lo como um agente minimizador de riscos. Nos momentos mais difíceis de administrá-lo, busco lembrar por que estou nesta caminhada. Me vêm à mente pessoas das quais contei histórias. O foco são elas, não eu.
Há perspectiva de sair dessa situação em breve?
Caramante –
Minha situação atual passa por constante avaliação da direção do jornal. Por enquanto, manteremos como está.
Como essa experiência está transformando você? Já é possível perceber alguns impactos e mudanças?
Caramante –
Situações dessa intensidade são oportunidades para reafirmar algumas ideias e descartar outras. Houve impacto, e mudanças certamente virão. Mas estão em curso, e por isso prefiro guardá-las aqui comigo.
Que ideias você reafirmou e quais descartou?
Caramante –
Reafirmei, por exemplo, a ideia de que tenho de permanecer alguém que conta as histórias dos outros, e também meu intuito de contribuir, minimamente que seja, para a melhoria dos setores que cubro. Deixei de lado a ideia de que riscos podem ser mensurados com algum grau de exatidão. Ninguém faz nada, até que alguém faça.
Como tem sido seu cotidiano nessa situação de ameaçado de morte?
Caramante –
Realmente acho difícil falar sobre isso. Há preocupação referente não apenas à situação atual, mas a como será no futuro. Esta não é uma situação que tenha prazo de validade.Agora à noite, um dos meus filhos disse que preferia estar na nossa casa de verdade. Perguntei o motivo. "Lá é mais colorido."

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

As relações de Cachoeira com o governo paulista.

(do Transparência SP)

Aos poucos, começam a vir à tona as relações da quadrilha de Cachoeira (através da empreiteira Delta) com o governo paulista.
A Delta, que fazia parte do consórcio responsável pela obra da Nova Marginal Tietê - principal vitrine de Serra na disputa presidencial de 2010 - subcontratava outras empresas para fazer as obras. O controle contábil destas operações era quase nenhum, dando margem à famosa "lavagem de dinheiro".
Só com a quebra do sigilo bancário deste consórcio e das subcontratadas é que será possível analisar o que realmente houve por trás destas operações.
Os personagens são controvertidos: Paulo Preto (acusado de desviar recursos de campanha do Serra e flagrado na Operação Castelo de Areia por comandar esquema de propinas em obras públicas), Delson Amador (flagrado na Operação Castelo de Areia por comandar esquema de propinas em obras públicas) e Heraldo Puccini Neto (responsável pela Delta no Sudeste e foragido da Justiça).
Apenas a grande mídia não se interessa em apurar.

Cachoeira e suas digitais em Sampa

(por Leandro Fortes, na Carta Capital)

Os técnicos da CPI do Cachoeira acabam de concluir um levantamento completo de todos os contratos firmados em São Paulo, governo estadual e prefeitura da capital, com a Delta Construções, ligada ao esquema criminoso comandado pelo bicheiro. É coisa de 1,2 bilhão de reais. O resultado, além de revelador sobre as relações dos governos do PSDB com a empresa-mãe da quadrilha de Cachoeira, trouxe à tona uma suspeita sobre os bastidores dos negócios milionários fechados na gestão do prefeito Gilberto Kassab (PSD), sob a influência do senador cassado Demóstenes Torres, do DEM de Goiás.

Uma interceptação telefônica realizada pela Polícia Federal durante a Operação Monte Carlo captou um diálogo entre Cachoeira e Cláudio Abreu, diretor da Delta na Região Centro-Oeste, onde ambos discutem contratos da empreiteira com a prefeitura de São Paulo. No grampo, de 31 de janeiro deste ano, o bicheiro pergunta a Abreu o resultado de uma conversa do ex-presidente da Delta Fernando Cavendish com Kassab sobre um contrato ainda não identificado. O diretor da construtora faz uma revelação: em consideração ao então senador Demóstenes Torres, o prefeito de São Paulo teria triplicado os valores do tal contrato. A conversa é a seguinte, retirado do áudio ao qual CartaCapital teve acesso:

Carlinhos Cachoeira: Outra coisa, Cláudio, você falou pro Fernando (Cavendish) do negócio lá do Kassab?
Cláudio Abreu: Ih, cara… Eu vou encontrar com ele mais tarde, eu vou voltar lá pra dar um retorno pra ele. Mas fala aí, o que é o negócio lá? Do contrato, né? Ele fez as coisas lá, né? Até pelo professor (Demóstenes Torres), né?
Cachoeira: Ele (Kassab) falou que triplicou o contrato por ele (Demóstenes).
De acordo com o levantamento feito pela CPI, a prefeitura de São Paulo tem três contratos com a Delta, firmados entre 2004 e 2012, num valor total de 307,6 milhões de reais. Um da Companhia de Limpeza Urbana (Comlurb), de 93,7 milhões de reais. Um de urbanização da favela de Paraisópolis, via Secretaria de Habitação, de 15,4 milhões de reais. E um da São Paulo Transporte S.A. (SPTrans), de 12,2 milhões de reais. Pela data do grampo da PF, não é possível detectar exatamente qual dos contratos teria sido triplicado, pois todos abarcam também o ano fiscal de 2012. Segundo Emerson Figueiredo, assessor de imprensa da prefeitura, Kassab “desconhece o diálogo, seus supostos autores e considera improcedente o seu conteúdo”.
As relações entre a Delta e o governo estadual tratam de cifras maiores, cerca de 943 milhões de reais, em valores corrigidos, referentes a contratos firmados durante os governos tucanos de José Serra (765 milhões de reais) e Geraldo Alckmin (178 milhões de reais), entre 2002 e 2012. Os negócios foram firmados a partir de demandas de cinco estatais: Desenvolvimento Rodoviário (Dersa), Departamento de Estradas de Rodagem (DER), Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee), Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A principal obra contratada pelo governo estadual à Delta, na gestão de Alckmin, é o chamado Consórcio Nova Tietê, de ampliação da avenida marginal ao Rio Tietê, no valor de 149,9 milhões de reais. O contrato valeu de 22 de junho de 2009 a 10 de abril de 2012. Ao analisar a transferência de recursos do consórcio para a conta da Delta, os técnicos da CPI concluíram que as empresas envolvidas na obra não possuem controle de compensação de créditos e débitos. Dessa forma, uma empresa pode ter subcontratado a outra e pago o valor total pelo serviço. Por esse artifício, a diferença de eventual desvio de dinheiro público, por meio de superfaturamento ou pela falsa notificação de entrega real do serviço, é devolvida ao subcontratante, sem fiscalização alguma.
A Delta pode ter acertado um esquema de lavagem de dinheiro por meio de subterfúgios burocráticos. Além disso, segundo a avaliação da CPI, as empresas subcontratadas pela construtora possuem entre si contratos mútuos de diferentes obras, serviços ou negócios (lícitos ou ilícitos) e fazem pagamentos entre si sem compensar valores por meio de controle contábil (oficial ou não).
As informações da CPI a respeito dos contratos estaduais coincidem com um levantamento anterior feito pela repórter Conceição Lemes, do site Viomundo, com base em dados do blog Transparência São Paulo, especializado em análise de contas públicas. A partir dessas informações, foi possível detectar que o contrato da Dersa, referente às obras no Tietê (415 milhões de reais) foi assinado por Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, diretor de Engenharia do órgão até abril de 2010, e pelo presidente da estatal, Delson Amador, que acumulava a superintendência do DER.
Intimamente ligado aos tucanos, Paulo Preto foi apontado como arrecadador de campanha do PSDB e chegou a ser acusado de sumir com 4 milhões de reais supostamente destinados à campanha presidencial de Serra em 2010. Os nomes dele e de Amador aparecem ainda em outra investigação da Polícia Federal, a Operação Castelo de Areia, na qual executivos da construtora Camargo Corrêa foram acusados de comandar um esquema de propinas em obras públicas.
Em 1997, durante a presidência do tucano Andrea Matarazzo, Delson Amador virou diretor da Companhia Energética de São Paulo (Cesp), depois privatizada. Era responsável pela fiscalização de obras tocadas pela Camargo Corrêa, como a Usina de Porto Primavera e a Ponte Pauliceia, construída sobre o Rio Paraná para ligar os municípios de Pauliceia, em São Paulo, e Brasilândia, em Mato Grosso do Sul. Amador foi chefe de gabinete de Matarazzo na subprefeitura da Sé, na capital paulista.
Uma certidão emitida pela Junta Comercial de São Paulo revela que Heraldo Puccini Neto, diretor da Delta para São Paulo e o Sul do Brasil, aparece como representante legal do Consórcio Nova Tietê. Escutas realizadas pela PF demonstram que Puccini é um dos interlocutores mais próximos de Carlinhos Cachoeira. Documentos da Operação Monte Carlo o apontam como um dos elementos da quadrilha que preparavam editais para ganhar licitações públicas.

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